HA-LAPID 3 ======================================= Mensagem do Resgate No dia 4 de Agosto deixei o Pôrto, as suas festas, as suas praias e parti para Traz-os-Montes, a-fim-de visitar os meus irmãos de crença dispersos por essas ser- ras transmontanas. Dírigi-me directamente para Argosêlo, pequena aldeia do distrito de Bragança. Dista desta cidade uns 20 a 25 km, e muito menos dista ainda das primeiras terras espanholas. As suas paisagens são rudes e severas e o solo pouco produti- vo. Vêm-se apenas oliveiras e casta- nheíros que a muito custo vegetam entre aquêles montões de granito que bem ex- primem a luta do homem pela vida. De quando em quando enxergam-se peque- nos campos verdejantes que um regato tortuoso a custo rega, ouvindo-se o mur- múrio triste das escassas àguas que de grandes alturas se vão despenhar entre um imenso abismo de pedras. Se do pon- to culminante da aldeia lançarmos um rá- pido golpe de vista, desfrutamos um vas to horizonte de terra avermelhada como fôgo, sulcado aqui e além por pequenos cursos de àgua que correm lentamente lá no fundo de inormíssimas montanhas. O aspecto dos seus habitantes condiz um pouco com a rudeza da região. O povo é rude de facto, mas entre aquelas almas selvagens existe um coração hones- to, leal e bom. Gente abençoada aquela!... Nunca o pobre ali morreu de fome e nunca ao viandante faltou ali o abrigo. Anda por 1500 aproximadamente o número de pessoas que habitam esta ter- riola, e são não sua maioria descendentes da perseguida raça hebraica. A sua principal fonte de riqueza vem das indústrias de cortumes industriais desde hà muito explorados e geralmente por pessoas de origem judaica como o provam vários documentos antigos. Foi nessa pequena terra transmonta- na, que outrora, perseguidos por Fer- nando e Isabel (Reis católicos de Espanha) muitos judeus se foram abrigar. Atravessando a fronteira do extremo norte do Pais, êsses desgraçados foram reunir-se em Caçarellos. Esse acampa- mento deu origem ao nome de Val de Ca- banas por que ainda é conhecida essa re- gião. Deste local ramifícam-se em diversas direcções procurando de preferencia as terras de maior comércio e indústria, ra- zão porque vamos encontrar dezenas de judeus em diferentes pontos de Traz-os- -Montes tais como: Bragança, Carção, Vi- mioso, Campo de Viboras etc. etc. Nestes pequenos cantos em que vive- ram, conservaram por longos anos as tra- dições dos seus antepassados. Às sextas-feiras reuniam-se em casas particulares, dando a estas reuniões aspec- tos de festas familiares, e iam fazendo, hoje aqui, amanhã ali, as suas orações ao Deus grande de Israel como vulgarmente lhe chamam. Uma vez por outra freqüen- tavam a igreja católica para se mostrarem cristãos fervoros aos seus visinhos. Esta assiduidade foi-se tornando em hábito, e alguns anos depois nem eram judeus nem católicos. Possuiam uma mistura de ideas e costumes como ainda hoje sucede. Por tal razão a igreja de Argosêlo foi dividida em duas partes; uma para êsses cristãos-novos, outra para os verdadeiros cristãos. A divisão era feita por uma corda, e isto, deu origem ao característico insulto de "Judeus da corda" que no concelho de Bragança é considerada como uma grande ofensa. Mas as perseguições passam de Espa- nha para Portugal e muitos infelizes são presos e transportados para Lisboa e Coimbra. Encerrados nas masmorras da Inquisição, foram muitas vezes obrigados a confessar crimes que não haviam come- tido, e por fim queimados em piedosos Autos de Fé. De especial para o povo de Argosêlo, passo a descrever uma lista de nomes dos condenados à inquisição e na qual encon- trarão sem dúvída, o nome de algum dos seus antepassados. Lista dos judeus da Aldeia de Argosêlo, condenados na Inquisição. João Rodrigues, João Rodrigues Ga-
N.º 080, Tamuz 5697 (Jun 1937)
> P03