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N.º 141, Nissan-Sivan 5708 (Mar-Mai 1948)







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               HA-LAPID             5
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A MISTERIOSA PERSONALIDADE DE BERNARDIM RIBEIRO

   (O Trovador do Amor e da Saudade)

               POR A. C. DE BARROS BASTO

   (CONTINUAÇÃO DO N.° 140 - CAP. II)

O encontro com o pai

É próximo do túmulo de Virgílio que
se dá o encontro de Bernardim com seu
pai Leon Hebreu. Talvez tivesse sido mar-
cado aquele local para que esse encontro
não fosse tornado suspeito para certas enti-
dades e porque ali se permitia troca de
impressões, que deveriam ser comoventes.
É a primeira vez que Bernardim vê o seu
pai, notando que ele e alto de aspecto sim-
pático e com um ar de nobreza antiga, e
trajava uma comprida vestimenta negra
como usavam os fisicos da corte.

Mas ouçamos como Bernardim narra
esse comovente encontro:

" ...ouvi bulir o arvoredo... tomou-me
medo; mas olhando para ali, vi que vinha
uma mulher; e pondo nela bem os olhos,
vi que era de corpo alto, disposição boa, e
o rosto de dona, senhora de tempo antigo.
Vestida toda de preto, no seu manso andar.
e maneios seguros do corpo, do rosto e do
olhar, pensativa que não apartava os ramos
de si, senão quando lhe impediam o cami-
nho, ou lhe feriam o rosto."

"Os seus pés trazia por entre as frescas
ervas, e parte do vestido estendido por
elas. E entre uns vagarosos passos que ela
dava, de quando em quando colhia um cau-
sado fôlego, como que lhe queria falecer a
alma.

"Sendo cerca de mim e me viu, ajus-
tando as mãos, à maneira de medo de
mulher, um pouco, como que vira coisa
desacostumada, ficou; e eu também assim
logo m'o não consentiu, mas da novidade
d'aquilo que ainda ali não vira...

"Mas não esteve ela muito tempo assim
porque, parece, conhecendo também que
estava com uma boa sombra, começou a
dizer, vindo ao meu encontro:

-Maravilha é ver donzela em ermo,
depois que a minha grande desventura
levou a todo o mundo o meu...



"E daí a grande pedaço, misturado já
com lágrimas disse:

... filho!"

"Depois, tirando um lenço, começou a
limpar o rosto, e a chegar-se para onde
eu estava.

"É ela;...(me disse)... me faz, senhora,
desejar saber quem sois, e que fazeis aqui
ou que viestes a fazer, formosa e só...

- "A mim podereis dizer tudo.

Bernardim diz-lhe que teve tristezas,
e quer fazer perguntas também ao pai.

- ,.. Maiormente da causa que foi das
suas quando não pôde, senão muito tarde.
dizer: - filho.

Leon Hebreu diz-lhe:

"...Há uma história muito falada nesta
terra... que há muito há que aconteceu.
Lembra-me que era eu menina e ouvia-a
já então contar a meu pai, por história.

"Agora, ainda folgo de cuidar nela pelos 
grandes acontecimentos e desventuras que
nela houve."

Refere-se Leon Hebreu à sua saida de
Portugal para Castela, ainda jovem, após a
morte do duque de Viseu em 1483, para ir
para a companhia de seu pai Don Isac
Abrabanel, amigo do duque de Bragança
e do duque de Viseu, que para salvar a
sua vida teve de emigrar.

Dirigindo-se a Bernardim diz-lhe que
os dias são agora grandes (o que nos dá
a entender que este encontro se passou no
verão de 1522) e terão tempo de contarem
um ao outro as suas mútuas tristezas.

Leon Hebreu diz a Bernardim:

-"Assim há já muitos anos que eu
não vivo para mim, e vim para estes ermos.
fugindo das gentes para quem só anoiteceu
e amanheceu...

"Muito me aprouve achar-vos também
conforme à minha tristeza; porque nos
consolaremos, ambas desconsaladas...

"Quando vos eu à primeira vista vi,
em o apartamento de toda a gente (que


 
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