HA-LAPID 3 ========================================== Abraham Nunes Bernal e Isaac de Almeida Bernal-dois mártires da Inquisição Por NORBERTO A. MORENO. A simpatia do Dr. Cecil Roth, erudito judeu britânico, pela causa marana devemos a publicação de um opúsculo que se intitula "Abraham Nunes Bernal et autres martyres contemporains de l'Inquisition", escrito como seria de desejar que fossem todos os traba- lhos de carácter histórico. Dele vamos extrair os elementos essen- ciais para a composição de uma ligeira bio- grafia das duas personagens principalmente tratadas no referido opúsculo e cujos nomes deixamos a sobrepor estas linhas. Trata-se de duas figuras que Ha-Lapid deseja incluir numa galeria de mártires da fé judaica que possa ficar como testemunho do que foi a vida e a morte dos maranos e portanto do que é o maranismo. Manuel Nunes Bernal, que possuía tam- bém o nome hebraico de Abraham, nasceu de pais maranos em Almeida, Portugal, no ano de 1612. Casou com Leonor Baez e teve cinco filhos que educou na fé de seus pais. Estabeleceu-se como comerciante em Ecija, Espanha. Leonor veio a ser, entre vários outros judeus maranos, açoitada e condenada a prisão perpétua pela Inquisição, em Córdova por volta de 1655. Na mesma altura um dos seus filhos, Jorge, de 13 anos de idade, nascido em S. Lucar de Barrameda, foi con- denado a quatro anos de prisão. Em Córdova, Dezembro de 1625, isto é, 30 anos antes da condenação de Abraham Nunes Bernal, foram chamadas a contas com a Inquisição cerca de cinqüenta pessoas, portugueses na quási totalidade, "culpados do nefando crime de judaizar". Contava-se entre estes, Ines Marques, viúva de Francisco Rodrigues, de Vila Real, cujo "crime" consistia em ter transformado, para consolação mútua dos correligionáríos perseguidos, a sua casa em Sinagoga. Em 1655, em Córdova, 3 de Maio, junta- mente cóm cinco outras pessoas, foi conde- nado à fogueira Abraham Nunes Bernal. Com a piedade característica os inquisidores fizeram todos os possíveis para que os réus se arrependessem do grande pecado de ado- rar o Deus de Moisés. Quatro chegaram a manifestar esse arrependimento, pelo que tiveram a recompensa de serem estrangula- dos antes de ir para a fogueira. Abraham Nunes Bernal ficou, porém, incensível, de- clarando que cousa alguma lhe poderia fazer diminuir a fé no seu Deus. O Marquês dos Velez que estava presente ao acto comoveu-se corn aquela persistencia, e, de crucifixo em punho, aproximou-se de Abraham, exortando-o à conversão. Mas tudo inútil. Abraham "foi queimado vivo porque declarou ser um observador da Lei de Moí- sés e morreu obstinado na sua crença, re- cusando vir à nossa santa fé católica" segundo reza a crónica hostil. A notícia deste auto produziu dolorosa impressão em Amsterdam, onde se haviam já fixado vários membros da familia do már- tir. Na Sinagoga realizou-se uma oração fúnebre em sua memória. Isaac da Fonseca Aboab traduziu num eloqüente discurso o estado de alma dos correligionários residentes naquela cidade. As notabilidades literárias da Comunidade compuseram elegias também em memória do mártir, que foram reunidas num volume publicado com o título Elogios que zelosos dedicaron á la Felice memória de Abraham Nuñes Bernal, que fue que- mada vivo sanctifcando el Nombre de su Criador. Esta obra, publicada por Jacob Bernal, é hoje muitíssimo rara. Sabe-se que das vítimas do auto de Cór- dova várias possuíam o nome de Baez, sendo provavelmente parentes de Bernal. Antes de 1650 foi também preso pela Inquisição um jovem de 17 anos, Marco (Isaac) de Almeida Bernal, de Montela (Galícia), filho de Francisco Rodrigues de Almeída e sobrinho de Abraham Nunes Bernal. Aquele jovem merece também especial mensão ao lado de Abraham. Durante cinco anos o Santo Ofício con- servou-o preso em Valladolid, esperando con- verte-lo ao catolicismo. No primeiro inter-
N.º 086, Tamuz-Ab 5698 (Jun-Jul 1938)
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