6 HA-LAPID ======================================== lei, os doutores que tinham sucedido aos profetas tiveram que pensar em estabelecer cerimónias novas, que recordassem as antigas e que podessem inspirar aos israe- litas os mesmos pensamentos de arre- pendimento, de contríção e de temor de Deus. O jejum foi necessariamente con- servado em todo o seu rigor; além da dor que êle infringe ao homem, éle torna-se uma oferenda pessoal que cada um trás a Deus. Muitas vezes nós temos dado ao nosso corpo satisfações supérfluas; nós podemos bem durante um dia lhe recusar o necessário. Mas o sacrifício não pode ser mantido, e como êles servem a marcar outrora as diversas fases do dia solene, foi preciso substitui-los por várias orações dum carácter muito especial. Outrora o culto feria os olhos e o espi- rito; hoje a pompa religiosa desapareceu. mas o espírito e o coração são profunda- mente tocados por sublimes meditações. Os poetas judeus da Idade-Média, dignos e inteligentes discípulos dos doutores dos primeiros tempos, elevam para Deus a alma dos fiéis por cantos religiosos. que lem- bram os esplendores do culto antigo, mas que sobretudo fazem pensar ao nada do homem e nas suas faltas à misericórdia e a grandeza de Deus. A véspera de Kipur, o israelita prepa- ra-se seriamente para a grande expiação do dia seguinte. Não só êle purifica o corpo com uma ablução, que é o simbolo da purificação da sua alma, mas êle deve san- tificar-se por benefícios espalhados à volta dêle. A penitência, segundo o judaísmo, é inseparável da caridade. Pelo meio do dia os fiéis se juntam. e cada um se entrega a um primeiro exame de consciência. Todos são avisados que éles se devem apresentar à noite perante Deus, libertos de todos os compromissos para com os seus irmãos. O perdão do Senhor não pode vir senão depois do próximo ofendido. Quando o sol desapareceu no horizonte, a hora santa da expiação soou. Uma oração emocio- nante sai de tôdas as bocas; nós pedimos a Deus uque tantas vezes atendia os pa- triarcas, os profetas e os justos de todos os séculos, de se dignar ouvir as novas vozes que o imploram." O livro sagrado da lei de nossos pais é então solenemente trazido à presença da assembléia; e a voz do pontífice, ao meio do recolhimento e da emoção, nos anuncia que Deus nos considera quites de todos os compromissos contratados com êle, se, a mão sobre a nossa consciência, nos não podemos executa-los. Mas se os nossos votos para com Deus são declarados nulos todos os nossos juramentos para com os nossos irmãos em particular e para com a sociedade em geral devem ser rigorosa- mente mantidos, quando não formos rele- vados por aquêles mesmos a quem nós os prestamos. "Senhor, dizia David, quem poderá subir a tua santa montanha? São os que caminham na integridade e na jus- tiça..., aquêle que mantém, mesmo contra o seu interêsse, as promessas que fêz." (Salmo XV). Neste augusto instante melhor que em qualquer outra ocasião, uma restrição men- tal seria desonesta culpada e impia. A ver- dadeira piedade não poderia nunca dar a mão à má fé. Logo começa a oração da noite; ninguém é esquecido, nem os chefes religiosos que são mortos, nem os ausentes, nem os viajantes, nem as vítimas da per- seguição. Em Israel, não se dirigem ao Céu súplicas egoístas, éste povo de irmãos, em virtude da sublime solidariedade que faz dêle uma fôrça moral indomável, pede sempre por todos, quer êles peçam assis- tência, quer éles implorem perdão. Quando a oração é terminada, a noite já cobriu a terra com os seus véus. O re- pouso nos é permitido. Mas antes que o sono feche as nossas pálpebras, os cantos sagrados do rei profeta nos convida uma vez mais a meditações santas; e uma su- blime poesia, obra admirável dum pro- fundo pensador judeu, eleva a nossa alma até aos pés do trono celeste. (Ben-Gabirol. que vivia em 1040, autor de Kether Mal- khuth; celebra Deus que criou o mundo, nos ensina os atributos divinos e nos faz assistir ao esplêndido espectáculo do seu poder "achando o nada por dele fazer sair o universo". A religião e a ciência são as duas asas de que o poeta se serve para voar na imensidade do infinito. Êle nos arrebata, no seu impetuoso esforço, dum planeta a outro, explicando as leis, medindo a forma e a órbita, segundo os dados cien- tificos do seu tempo. O audacioso poeta, levado pela sua imaginação fogosa, ultra- passa as mais altas esferas, e não para senão no limiar secreto da divina Magestade.
N.º 120, Kislev-Tevet 5704 (Nov-Dez 1943)
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