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N.º 120, Kislev-Tevet 5704 (Nov-Dez 1943)







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 8              HA-LAPID
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da vingança, mas um Deus de amor e de
caridade. Nós podemos contar com o
nosso Pai celeste. Tudo nos pode faltar
num momento; o nosso próprio corpo,
enfraquecido pela doença ou curvado pela
idade, pode um dia nos recusar os seus
serviços. Uma hora virá em que os nossos
lábios não se abrirão mais para pedir per-
dão; mas Deus não nos faltará nunca.
Que do fundo da nossa alma nós nos ele-
vemos para Éle. Êie virá em nosso socorro
e nos fará misericórdia. Um pai nunca é
surda para os seus filhos.

Sim, nós seremos certamente perdoa-
dos, se o nosso arrependimento foi verda-
deiro e se nós temos corajosamente repa-
rado as nossas faltas. As portas da Casa
de Deus não serão fechadas. sem que nós
tenhamos feito ouvir um canto solene de
triunfo (Nehilah). As nossas dores estão
terminadas: nenhuma aflição não nos deve
afligir mais. Pecadores. nós recebemos a
garantia do perdão ; culpados, nós obti-
vemos a graça divina. O Senhor disse:-
Eu não quero a morte do mau; que êle
regresse dos seus maus caminhos e que
ele viva (Ezequiel, XVIII). Mas se a Nehi-
lah é o encerramento de Kipur, deve tam-
bém sê-lo de nossos pecados. O mal foi
vencido e dominado. como outrora Baal
sôbre o Carmel. Quanto a nós. como
outrora o Povo israelita, convertido pelo
profeta Elias, nós não reconhecemos outra
realeza que a do Senhor, e nós exclamamos
solenemente: Só o Senhor é Deus, só o
Senhor é Deus (Adonai hu Elohim). Que
estas palavras santas se tornem dora-avante
o nosso grito de reünião na nossa luta
contra as paixões que nos cercam. Quais-
quer que sejam os encantos que a sedução
nos apresente, desvia os olhos com firmeza.
Pensemos que um dia virá em que uma
voz terrivel ressoará aos nossos ouvidos.
O instrumento sagrado do qual os sons
majestosos se fazem ouvir no derradeiro
momento de Kipur, não é mais que o sim-
bolo do temível apêlo que nos citará cedo
ou tarde ao tribunal de Deus. Não é sem
motivo que o dia das expiações chega para
nós depois do doce prazer da primavera e
das ricas colheitas do estio. Como a re-
ligião, a natureza nos convida a pensa-
mentos sérios. As flores começam a
desaparecer, os frutos foram colhidos; as
próprias folhas vão cair das árvores ao pri-



meiro sopro do vento. O inverno avança
a largos passos; ainda algumas semanas e
o seu hálito gelado vem trazer o frio
nossas moradas. O inverno da nossa vida
se aproxima também. Cada dia que passa
é uma fôlha da nossa existência que cai
murcha na poeira do passado. Nós sen-
timos então que à volta de nós os homens
e as coisas não podem dar-nos o repouso
e a consolação que nós procuramos. E
é-nos preciso um imenso amor; nós o
encontraremos no seio de Deus num futuro
eterno de celestes gozos.

Tal é Kipur como foi instituido pelo
Legislador divino de nossos pais, e assim
como mais tarde o fizeram os homens da
Grande Sinagoga, e depois dêles os poetas
judeus da idade-Média. Esta solenidade é
fecunda, nós o vimos, em lições duma
alta importância, em ensinamentos profun-
dos. Ela é necessária para nos arrancar
de tempos a tempos ao mundo e nos re-
conduzir a Deus.

O arrependimento não nos é tornado 
fácil, mas os rigores nos são abrandados
e a bondade divina o põe ao nosso al-
cance; basta-nos um esforço para regres-
sar ao bem.

Êste esfôrço, é o sacrifício, sacrifi-
cio material outrora sacrifício moral hoje.
Êste esforço é o afastamento do mal e
o cumprimento do bem; é a transfor-
mação do homem pela purificação espi-
ritual, isto é, pela religião; é a sua re-
generação pela dedicação ao seu próximo.
isto é, pela caridade. Um grande problema
foi posto pelos dogmas de todos os povos:
-o homem caido no pecado pode sair
dêle pelas suas próprias forças? Kipur é
a resposta do judaísmo; êle é a glorificação
da liberdade humana. O homem que foi
livre de pecados é livre de bem-fazer. O seu
arrependimento lhe pertence, e Deus está
sempre preparado para receber o seu re-
gresso à virtude. O homem é senhor
do seu destino moral; é só querer, e
seu Pai celeste, segundo a bela expressão
de Ezequiel, espalhará sôbre êle as águas 
puras da salvação. (Ezequiel, cap. XXXVI, 
vers. 25).

   Paris, 1864.

                ELIAS Aristides Astruc,
             Rabino-adjunto do Rabi-mor
                      de Paris.


 
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