4 HA-LAPÍD ========================================= menino que estava envolto em tais panos (e certamente o menino era tal) que muito ali diziam mal. A cabra aqui representa a ama da criança, cujas roupagens deviam ter letras ou emblemas judeus e certamente, como êle diz, o menino era tal dos que ali muito diziam mal, isto vem favorecer a minha hipótese. Sancho devia ser uma das pessoas que por ordem de El-Rei D. João II se apo- derou do filho de Judah Abrabanel e tomou conta dêle em sua casa. Na Ecloga diz Sancho que o levou à sua Teresa, certamente sua esposa, o que nos indica que se êste é Sancho Tavares só casou com Inês Zagalo após a morte da sua Te- resa. Descreve Sancho todo o periodo da meninice de Bernardim até à idade de poder ajudar à missa ao clérigo. Mas sendo San- cho Tavares, proprietário em Extremoz vi- veria bastante tempo no Torrão para que o filho adoptivo (hijo en el amor) podesse ser considerado como natural dessa terra? Ou passaria a viver com outra familia do Torrão? Não sabemos. Não me repugna acreditar que D. Joana, filha de Sancho Tavares fosse a primeira namorada de Bernardim, visto que êle pró- prio confessa dever-lhe muitos favores, e também facilmente se compreende que a familia de Joana a quisesse casar com outra pessoa diferente de Bernardim, cuja origem conhecia. Delfim Guimarães, nos seus livros "Ber- nardim Ribeiro-o poeta Crisfal" e "Teó- filo Braga e a lenda Crisfal", diz: -"Bernardim Ribeiro é um dos astros fulgurantes da rútila constelação que brilha, intensa e perduràvelmente, no céu de Portu- gal, e ainda hoje nos deslumbra o seu fulgor..." "O Cancioneiro Geral, publicado em 1516, começou a imprimir-se em Almeirim e foi concluido em Lisboa, trabalho que levou dois anos a ser executado. É natural supor que Garcia Resende, na organização dos materiais para o seu volumoso in-folio, não consumiu menos que dois a três anos, e assim pode deduzir-se que à data de 1511-12 já Bernardim Ribeiro era poeta conhecido e apreciado." "Os amores infelizes do poeta por Joana ou Aonía são o tema exclusivo das suas éclogas e da sua novela, e de grande nú- mero das cantigas com que Bernardim Ri- beiro enriqueceu o lirismo português. A paixão do poeta serviu também de assunto a algumas das melhores composições que nos legou o seu amigo, confidente e colega Francisco de Sá de Miranda." Da Universidade devem ter datado as relações da funda amizade que uniram por longos anos os poetas Sá de Miranda e Bernardim Ribeiro. "Entre os 31 capitulos que constituem a primeira parte, ou o chamado Primeiro livro das Saudades de Bernardim Ribeiro, e os 58 capítulos da parte segunda, a dife- rença do estilo é tão manifesta, salta aos olhos por forma tal, que o mais rudimentar critério de estudantinho do liceu, sem grande estudo, conclui pela diversidade do autor. Na segunda parte, dois escribas anóni- mos procuraram imitar a prosa correntia e adorável de Bernardim Ribeiro; mas falhos de talento e falhos de cultura, não conse- guiram outra coisa mais do que encher algumas dezenas de páginas com um amon- toado de baboseiras sem nexo, despidas de todo o interêsse, e em que os episódios cheios de ingenuidade e frescura da primeira parte são pastichados por uma forma ignóbil". Delfim Guimarães, depois de ter demons- trado que a Ecloga Crisfal é da autoria de Bernardim. diz: "Alcançada a convicção de que Crisfal era um anagrama de Bernardim Ribeiro, e norteados pelo conhecimento de que nas suas produções o poeta mudava constante- mente os seus nomes pastoris, com um pe- queno trabalho de raciocinio não nos foi dificil deduzir a constituição do criptograma que era formado pelas primeiras sílabas das palavras Crisma e Falso." Aqui discordo, em parte, de Delfim Gui- marães pois para mim o nome Crisfal é formado pelas primeiras sílabas das pala- vras Cristão Falso. José Pereira de Sampaio (Bruno) afir- mava que Delfim Guimarães estava com a verdade que o trovador Cristóvão Falcão era simples produto duma lenda, que o criptónimo Crisfal pertencia a Bernardim Ribeiro. Em nenhum dêstes autores referidos encontrei qualquer elemento seguro que de qualquer forma viesse contrariar, em todo ou em parte, a minha hipótese, antes porém de fazer a exegese da Menina e Moça e das e das éclogas de Bernardim e do seu amigo
N.º 117, Sivan-Tamuz 5703 (Mai-Jun 1943)
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