HA-LAPID 5 ======================================== OS JUDEUS EM PORTUGAL (CONFERÊNCIA) POR DR. MAX AZANCOT (Continuação do n.° 131) O Padre António Vieira é preso. D. João IV é excomungado, e D. Luís da Cunha, o célebre diplomata do tempo de D. João V, arcedíago da Sé de Évora, que representou Portugal em Londres, Madrid e Paris, pôde escrever no seu Testamento Politico, desmentindo a lenda do mercan- tílismo judaico: Da mesma sorte dissera que V. A. acharia certas povoações quase desertas, como por exemplo na Beira Alta, os grandes lugares da Covilhã, Fundão e cidades da Guarda e de Lamego; em Trás-os-Montes, a cidade de Bragança; e destruídas as suas manufacturas. E se V. A. perguntar as causas desta dissolu- ção. não sei se alguma pessoa se atre- veria a dizer-lho com a liberdade que eu terei a honra de fazê-lo; e vem a ser que a inquisição prendendo a uns por crime de judaísmo e fazendo fugir os outros para fora do reino com os seus cabedais, por temerem que lhos confis- quem, se fossem presos, foi preciso que as tais manufacturas caíssem, porque os chamados cristãos novos as susten- tavam e os seus obreiros que nela traba- lhavam eram em grande número, foi necessário que se espalhassem e fossem viver em outras partes. Tal como D. Luís da Cunha, António Ribeiro Sanches, afirmava que fôra des- truída a indústria de seda em Trás-os-Mon- tes e a das lãs na Beira e no Alentejo. Vencidos, expulsos e perseguidos pelos seus compatriotas desapareceram da vida pública do Pais os judeus que tinham ajudado a formar a nação, que salvaram o Brasil, que para ali levaram a cultura do açúcar, que ainda na época da restauração tanto contribuiram para o reconhecimento da independência de Portugal. Desapareceram para só ressurgir mais de um século depois. No século XIX encontramo-los ao lado dos cristãos a cul- tivar o cacau em S. Tomé, a colónia de que se orgulhava o nosso País por ser nessa época o maior produtor de cacau no mundo. O cacau que durante anos de crise económica foi um dos principais recursos da nossa exportação. Encontra- mo-los na Companhia Nacional de Nave- gação, a única que assegurava carreiras regulares para as nossas colónias; encon- tramo-los nos Açores a introduzir a cultura do ananás e do tabaco; encontramo-los em meados do século passado na junta das obras que realizou o porto de Ponta Del- gada e dele fez um importante porto de escala. Encontramo-los a colaborar irmã- mente com os demais portugueses na cria- ção de escolas superiores. Bensaúde foi o primeiro director do Instituto Superior Técnico e a pessoa que o impôs, Amzalak nas Ciências Económicas, e tantos outros, na geração actual. Se nos referirmos às obras sociais hoje tão em moda, veremos as primeiras Caixas de Previdência para operários, no Pais, numa fábrica de judeus; a fábrica de tabaco dos Açores. Temos o enxoval do recém- -nascido criado pela Sr.a D. Hannah Se- querra, algumas dezenas de anos antes da Obra das Mães. Servir e ser útil tem sido o lema dos judeus em Portugal. Criar e colaborar a sua divisa. * Vai longa já esta exposição e quanto me ficou por sumariar! Não referi sequer os médicos judeus que tão grande fama atingiram. Não tomei o vosso tempo com referên- cias à cultura dos judeus em Portugal.
N.º 132, Nissan-Yiar 5706 (Mar-Abr 1946)
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