8 HA-LAPID ====================================== TITULO XCIII De como os Tabeleâis dos Judeus hão de fazer suas Escrituras El-Rei D. João meu Avô de gloriosa memoria em seu tempo fez Lei em esta forma, que se segue: 1.° D. joão pela graça de Deus Rei de Portugal, e do Algarve. A quantos esta carta virem fazemos saber, que a nós é dito, que os Tabeliãis das Comunas dos Judeus dos ditos nossos Reinos fazem todalas Cartas, e Escrituras, e Estormentos per Abraico. E vendo nós em como se delo seguia, a segue perda, e dano a nós, e ao nosso Povo: Porem nós com acordo dos do noss Conselho Ordenamos, e manda- mos, que qualquer judeu, que fôr Tabelião dessas Comunas dos Judeus, não faça Carta, nem Estormento, nem Escritura per Abraico, senão per linguagem ladinha por- tuguez; e fazendo eles, ou cada um deles o contrario desto, mandamos que morra por elo. E porem mandamos que assi se guarde todo nosso Senhorio. 2.° A qual Lei vista per nós, achamos que era muito odiosa na parte da pena porque segundo direito e comunal razão, a pena deve sempre corresponder ao malefi- cio, e não parece ser cousa razoada, que por tão leve crime algum homem haja de morrer. E porem limitando a dita pena, mandamos que a dita Lei haja lugar no Tabelião, que fezer a dita Escritura em letera Abraica por fazer falsidade, e de feito a fez; e no caso, onde o dito Tabelião fizesse a dita Escritura verdadeiramente sem fazendo outra falsidade, ainda que a fizesse em Abraíco, tal como este manda- mos que seja açoutado publicamente, e perca o Oficio, e nunca mais o possa aver em algum tempo. 3.° E com esta limitação, e declaração mandamos que se guarde a dita Lei, assim como em ela é conteudo, e per nós aqui declarado. com dito é. ---------------------------------------- A JUDIARIA DE LISBOA NO SÉCULO XV (Segundo o depoimento dum viajante cristão) Na Revue des Etudes juives, foi publi- cado um estudo do rev. Rabi Julien Weil sôbre a História dos judeus em Espanha e Portugal no século XV. O autor publica extractos da viagem dum médico, Jerome Munze que visitou Lisboa nos fins de Novembro de 1494. Transcrevemos a curiosa descrição que faz o viajante dos bairros judeus e das suas sinagogas. "-Os judeus têm três bairros privativos abaixo-da-fortaleza (Castelo de S. Jorge) no sopé do monte, os quais são fechados todas as noites. No sábado, véspera de Santo-André, eu visitei a sua Sinagoga; eu nunca vi nada de semelhante. A' frente encontrava-se um pátio que era coberto por uma vide enorme cujo tronco media quatro palmos de circunferência. Que magnifico local com um púlpito para pregar como nas mesquitas. Ali ardiam dez grandes candelabros tendo cada um cinqüenta ou sessenta lâm- padas, sem contar muitas outras mais. E as mulheres tinham uma Sinagoga separada, onde ardiam muitas e numerosas luzes. Os judeus de Lisboa são muito ricos e são os recebedores dos impostos dos quais o rei lhes deu a concessão. Eles apre- sentam-se com altivez perante os cristãos. E êles estão muito apreensivos porque o rei de Espanha pediu ao rei de Portugal para expulsar os maranos e também os judeus, e no caso contrário lhe faria guerra. O rei de Portugal, seguindo o exemplo do rei de Espanha, deu ordem a todos os maranos para saírem do País até ao Natal. Estes fretaram um navio de nome Rainha e em meados de Dezembro partiram para Nápoles. Quanto aos judeus, o rei deu-lhes dois anos completos, para serem expulsos metó- dicamente. Desta maneira, os judeus vão-se embora continuamente e procuram estabelecerem- -se no estrangeiro.
N.º 110, Nissan-Yiar 5702 (Mar-Abr 1942)
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