HA-LAPID 5 ========================================== daquele Principe depois de desposado com a Infanta, para possuir a qual tantas dili- gências fizera por alguns anos? Que causa poderia haver para afrontar, os senhores e cavaleiros portugueses, e, o que mais é de admirar em uma época na qual as tradições de cavalaria não tinham acabado de todo, para maltratar tão indignamente não só a Infanta mas as damas do seu séquito? Um motivo houve, por certo, para tão repentina mudança de proceder; para o saber con- certeza debalde interrogariamos as trevas do passado; mas pode aventurar-se uma conjectura; a notícia dos amores da Infanta com um cavaleiro português teriam chegado aos ouvidos do senhor de Vallaison (Cláu- dio) que revelaria a seu amo depois das núpcias, o terrivel segrêdo que levara de Portugal, porventura o receio de que entre os que na viagem a acompanharam existisse o seu rival, e de que alguma das damas o favorecesse, viesse a acender o ciúme do Duque, e o obrigasse a partir logo para o Piemonte, embargando tão àsperamente o passo aos cavaleiros que iam após êle, com intenções cortezes. A leitura atenta da me- mória que transcrevemos parece dar grande pêso à conjectura que fazemos." Conde de Sabugosa nas Donas de Tempos idos, diz: "Não custa a crer também que a ino- cente beleza da Infanta seduzisse o impres- sionável autor da Menina e Moça, que saía dos serões do Paço cogitando naqueles versos, que dizem: Se nasci por meu mal ver e não por vê-lo acabado melhor fora não nascer que ver-me desesperado. Amaram-se? Foi Beatriz a desditosa Aonia? Os críticos teimam em asseverar que tal não podia ser fundados em argu- mentos tirados dos próprios versos do poeta, da comparação de datas (prováveis pois as não há seguras para a vida de Bernardim Ribeiro), e de motivos de ordem moral, que nem sempre convencem, porque é sabido que em matéria de sentimento não são im- pedimentos nem a desproporção de idades. Bem a desigualdade de jerarquias, nem muitas outras considerações sociais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Para a memória da Infanta D. Beatriz, e para o respeito que ela nos inspira nada importaria que se tivesse deixado enterne- cer pela platónica fantasia amorosa de um poeta bem aceito na Corte, visto que a própria História nos dá noticia de como ela foi sempre intangível na sua reputação, dedicada ao desageitado marido, e como em Itália afastara suavemente, mas com firmeza, êsse poeta que lhe apareceu no Piemonte levado pela fôrça da sua pai- xão". Em tão excelente companhia nenhuma dúvida tenho em afirmar que convicto estou da veracidade dos amores sentimen- tais de Bernardim com a infanta D. Beatriz, mas vou continuando a citar outros auto- res, que nos indicam elementos de utilidade para o almejado fim. (Continua). ------------------------------------------ Catulle Mendes Abraham Catulle Mendes, literato fran- cês, poeta e comediógrafo. nasceu em Bor- déus em 1847, e faleceu em 1909. Seu pai chamava-se Tibulle Mendes e sua mãe Reine. Seu pai e seus ascendentes, vindos de Portugal, eram banqueiros em Bordéus há mais de 100 anos. Eram judeus portugueses intelectuais que emigraram da sua terra natal para evitar perseguições da Inquisição, e assim conser- varam intactas a sua liberdade de pensar, a sua cultura e a sua elegância de espirito. Na sua residência bordeleza existe um qua- dro a óleo sóbrio e expressivo mostrando, no centro duma biblioteca onde brilham os tons quentes e os ouros extintos das enca- dernações antigas, um homem de belo aspecto, de discreta distinção, a larga fronte tocada de luz, os traços bem marcados, e que tem na mão a obra dum autor latino. Tendo traduzido Tibulo e Catulo, tive a idéia de dar o nome do primeiro a seu filho e ao seu neto o nome do segundo. Em Maio de 1939 a cidade de Bordéus comemorou solenemente a recordação de Catulle Mendes. Entre outras homena- gens uma placa foi colocada na casa onde nasceu.
N.º 116, Nissan-Yiar 5703 (Mar-Abr 1943)
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