4 HA-LAPID ======================================== O Gato devoto CONTO JUDAICO POR I. L. PERETZ Havia numa casa três passaros canto- res que todos três foram, um apos outro, maltratados pelo gato. Não era um gato vulgar, mas um gato verdadeiramente devoto, tambem não era sem motivo que ele usava a alva, a can- dida vestimenta imaculada e tinha olhos onde se reflectia todo o céu. Era um gato piedoso, um gato que fazia as suas abluções. Dez vezes por dia ele se lavava, e comia muito vagaro- samente, acaçapado a um canto. Durante todo o dia, um pedacinho de qualquer lacticínio encontrado aqui e acola lhe bas- tava e só quando era chegada a noite era que comia carne, da boa carne licita de rato... E pois ele não se apressava na come- doria como os de baixa especie. Êle não se apressáva, nem se empanturrava como fazem os glutões, mas comia lentamente, gozando com isso. Que viva ainda um momento o rato, ainda um minuto; que dance ainda um pouco, que trema e que faça a sua suprema confissão; um gato piedoso não se apressa. Quando trouxeram o primeiro pássaro para a casa, o gato sentiu imediatamente por ele uma grande piedade; ele tinha o coração contricto. - E tão bonito, gemia ele, tão pequeno; e dizer um pássaro tão gracíoso não gozará das alegrias celestes. Isto não pode me- recer o ceu! Isto diz o gato com convic- ção. Primeiramente porque isto se lava duma maneira bem laica, isto mergulha todo o seu corpo numa terrina com água. Depois, só o facto de ser pôsto numa gaiola demonstra que é um bicho mau. Apesar de ainda ser novo, meigo e bom, este pássaro cantor mostra já mais incli- nação para a violencia do que para a submissão! Agora que dizer deste canto, este canto atrevido, este assobiar e esta maneira des- respeitosa de olhar direito para o céu! E estes esforços para partir a gaiola, para voar para o mundo ímpio, para o ar livre; e este olhar voltado para a janela aberta!... Já alguem viu um gato encerrado numa gaiola? Um gato piedoso ousou alguma vez assobiar tão descaramento? -Contudo e pena, suspira o terno coração do gato devoto; não é um ser vivo, uma alma preciosa, uma centelha lá de cima! Lágrimas molharam os olhos do pie- doso gato: -E toda a desgraça vem de que este corpo lmpio é tão bonito, tão atraido para os gozos terrestres e que o Espirito de Tentação tem tanto poder sôbre ele. Como um passarinho tão meigo pode- ria resistir a este temível Espirito de Ten- tação! E quanto mais isto vive, tanto mais isto comete pecados e tanto maior será o castigo... Ah! exclamou ele. ------------------------------------------- representativo, o Grande Sacerdote puri- ficava-se por uma nova ablução, tirava os seus vestidos de linho, cobria-se com as suas vestes pontificais e voltava ao altar para continuar o seu serviço. Esta puri- ficação, estas vestes mudadas significava que depois da destruição do pecado, o perdão do Senhor faz do culpado um novo homem. O povo, liberto das suas iniqui- dades, obtinha a graça de Deus e torna- va-se puro. Profundamente penetrado pela majestade do espectáculo que se lhe ofere- cia durante este dia solene, ele experimen- tava infallvelmenre o sentimento de arre- pendimento que o culto público de Kipur tinha por fim de excitar nele e assim reconciliar-se com o Eterno. (continua)
N.º 119, Tishri-Heshvan 5704 (Set-Out 1943)
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