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Ha-Lapid הלפיד


N.º 122, Nissan-Yiar 5704 (Mar-Abr 1944)







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 6             HA-LAPID
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           OS CABALISTAS

           CONTO JUDAICO

                 por I. L PERETZ
Quando os tem-
pos são duros, tudo
vai mal, mesmo a
Thorah, que é a
melhor Séhorah.
(Provérbio judeu:
A ciência dos livros
sagrados, que é a
melhor mercado-
ria). De todo o
seminário judeu de Lashtchive não restava
mais que o Reitor, Rabi Vekel, com um só
e único discípulo.

O Reitor era um velho judeu, magro
com uma longa barba inculta, de olhos
fatigados e apagados, Lémekh, seu disci-
pulo amado, era um jovem, magro também,
alto, pálido, com guedelhas negras encara-
coladas nas suas fontes, olhos negros,
ardentes, com olheiras azuladas, lábios
ardentes, um pescoço descarnado; os dois
homens, não tendo camisa, iam com o
peito à mostra; ambos estavam esfarrapados.

O Reitor arrastava ainda, com grande
custo, velhas botas de camponês; o disci-
pulo tinha os pés descalços em tamancos,
que perdia constantemente.

E era tudo o que restava do famoso
seminário judeu!

A pequena cidade. empobrecia-se, enviava
cada vez menos géneros alimentícios, ela
tinha oferecido aos estudantes eclesiásticos
alguns dias de hospitalidade cada vez mais
raras: (os fiéis combinavam entre si para
que cada Talmid (estudante) fosse convi-
dado cada dia numa casa judaica) então os
pobres Talmidim se tinham dispersado.
Mas Rabi Vekel queria ser enterrado em
Lashtchive e o voto mais querido do disci-
pulo era de fechar os olhos do seu mestre.

A êles também, chegou-lhes agora o
conhecer os sofrimentos da fome. Uma
alimentação insuficiente dá um sono insufi-
ciente, e a vigília que se prolonga durante
noites inteiras, e a falta de alimento, dando
o desejo de praticar a Cabalah. E de facto,
se é preciso velar durante noites, ficar de
estômago vazio durante dias, é bem pelo
menos tirar proveito disso. Transformemos
as nossas misérias em jejuns e mortifica-
ções, e quando em troca se abrem de par
em par as portas dêste mundo que contém
os mistérios, os espiritos e os anjos!

Também há muito tempo já que o Rabi
e seu discípulo estudam a Cabalah.



Hoje êles estão
assentados, sozi-
nhos, diante duma
grande mesa. Se
para cada um é o 
o depois de jantar,
para êles é o antes
do pequeno almôço.  
De resto já estão
habituados a isso.
O Reitor abre desmedidamente os seus
olhos brancos de êxtase e fala. E o dis-
cipulo escuta com a cabeça entre as mãos.

-Há, diz o Reitor, vários graus: um
conhece uma parte, um outro uma metade.
outro ainda uma melodia. O nosso fale-
cido Rabi conhecia uma melodia completa,
e mesmo com acompanhamento. Mas eu,
acrescentou êle com tristeza. mas eu mereço
apenas a graça dum pequenino trecho, não
maior que isto...

Êle mostrou a extremidade dum dos seus
dedos descarnados, e continuou:

-Há melodias que exigem palavras...
É um grau bastante baixo... Existe um
grau superior: Uma melodia que canta
sozinha, sem palavras, uma melodia pura!
Mas a melodia pede ainda uma voz... e
lábios, através dos quais passe a voz. E os
lábios, compreendem tudo, é matéria! E a
própria voz, bem que materia muito deli-
cada, é ainda matéria!

Finalmente concordemos que a voz se
encontra sôbre o limite entre o material e o
espiritual!

"Pois, seja como fôr, a melodia que, se
faz ouvir por intermédio da voz, que por
sua vez depende dos lábios, não e ainda
pura, ainda não completamente pura....
ainda não alguma coisa de verdadeiramente
espiritual.

"Mas a verdadeira melodia se canta sem
voz alguma... ela canta interiormente no
coração, no fundo das entranhas!

"Eis o sentido destas palavras do rei
David:-Todos os meus ossos o testemu-
nharão." É na medula dos ossos que isso
deve cantar; é ali que deve estar a melodia,
o supremo louvor ao Senhor. Não é já a
canção dum ser frágil, a música imaginada
por um cérebro humano: é uma parte do
canto pelo qual Deus criou o mundo,
uma parte da alma que êle lançou neste
mundo.

"Assim cantam os anjos do céu! E era


 
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