2 HA-LAPID ============================================ DON ISAC ABOAB (ÚLTIMO RABI-MOR DE CASTELA) VEM REFUGIAR-SE E FINDAR OS SEUS DIAS NO PORTO POR A. C. DE BARROS BASTO (Ben-Rosh) Don Isac Aboab nasceu em Toledo em 1433. Foi discípulo do Rabi D. Isac Campaton, Rabi-mor de Castela, e suces- sor do seu mestre no alto cargo de chefe supremo dos judeus castelhanos. D. Isac Aboab foi um comentador bíblico espanhol muito notável, tendo deixado várias obras suas, escritas em hebreu, cujo assunto consta de sermões e comentários teoló- gicos. Foi cognominado, por vários escri- tores israelitas, "o último gaon de Castela". Depois que os reis católicos Fernando e Isabel decretaram a expulsão dos judeus, em 1492, ele, com trinta outros dos mais respeitáveis judeus da sua terra, chegou a Lisboa com ordens de negociar com o rei D. João II de Portugal para a recepção dos seus correligionários banidos. Ele e os seus companheiros foram habi- tar em condições favoráveis no Porto. Morreu, poucos meses depois da expul- são, em Janeiro de 1493. O seu discípulo, o cronista e matemático Rabi Abraham Zacuto, dirigiu o seu funeral. Muitos dos discípulos de Aboab atingi- ram grandes distinções. Seu filho, Jacob Ben-Isac Aboab, editou em 1538, em Cons- tantinopla, a sua obra Nahar Pishon (Rio Caudaloso) que é uma colecção de sermões. Um seu parente, Imanuel Aboab, nascido no Porto, no seu livro Nomologia, narra estes acontecimentos da forma seguinte: -"E deve saber o curioso leitor, que em Castela foi mui estimado este senhor dos Reis Fernando e Isabel; e logo que em Março, do ano mil quatrocentos e noventa e dois, fizeram em Granada a pragmática dita contra os judeus, se foi o venerável sábio, com outras trinta casas de nobres Israelitas, a Portugal, a concertar com El-Rei. que era então João, segundo daquele nome, a quem sucedeu Emanuel. Foram bem recebidos de El-Rei, e acordaram, que pudessem entrar no Reino, seiscentas casas de Judeus, com pagar-lhe oito escudos de ouro cada um (como escreve Osório, apesar que o Usque diz somente dois escudos) e ao cabo de seis anos, lhes mandaria dar navios acomodados, e por moderados pre- ços, para poderem, sair de seus reinos, para partes de África, ou Levante, como mais quisessem. A estas trinta famílias mandou El-Rei acomodar na cidade do Porto; e fez que a cidade desse a cada uma delas uma casa; como deram mui cómodas, na rua que chamam de S. Miguel, e em meio de todas elas estava a Sinagoga, que eu me recordo haver visto ainda na minha meni- nez sem estar derrocada. "Tinham as ditas trinta casas um P. por armas, que mostrava o nome da cidade. Pagavam de pensão, cinquenta reis, ou maravedis cada uma à cidade, e ela lhes fazia empedrar a rua; uma destas trinta casas era a de meu avô o senhor Abraham Aboab, a quem o Senhor perdoe. Sucedeu então aquela crueldade enormíssima, de mandar El-Rei dom João levar muitos me- ninos dos Hebreus às Ilhas que chamam dos Lagartos; por causa de haverem pas- sado a Portugal mais número de gente, que as seiscentas casas capituladas. A todos os que foram de mais, condenou El-Rei, e tomou por seus escravos, e aos filhos ino- centes mandou levar às ditas ilhas dos Lagartos. "Antes de ver este lastimoso espectá- culo, e os outros que lhe sucederam nos anos seguintes passou a gozar a vida eterna o bendito Rab; e entendo que está sepul- tado na cidade do Porto. De todos os seus discípulos, que foram muitos, e mui exce- lentes, não acho que haja passado algum a Portugal, além do Rabi Abraham Zacuto. Astrónomo de El-Rei dom Manuel: o qual conta a morte do seu honrado mestre, e
N.º 135, Tishri-Kislev 5707 (Set-Nov 1946)
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