6 HA-LAPID ========================================= o véu do Templo se rasgou do alto até baixo, e a terra treme e as montanhas se abrem. Mas é preciso que vós me escuteis. Eles não ouviam nada. Os seus olhos vitrificados fixavam-se no signo pelo qual os seus corpos tinham sido feridos, eterni- dade sem fim. e o seu sangue derramado como se fosse vinho. Os cães estavam re- pletos dele. que bebiam nos regos das ruas. Eles não ouviam nada. Mas o seu san- gue iá acalmado batia-lhes agora no cére- bro como o batente duma porta. Os seus dedos encolhiam-se como garras. O ar era vermelho como reflexo dum fogo ou de algum sangue fumegante derramado. As suas faces salam dos seus peitos Os seus corpos estendiam-se para a Arca, violada como nunca ainda nos anais da sua raça; estendiam-se para o apóstata, inspirado e hediondo, para a sua garganta. para os seus olhos. Então ouviu-se uma voz que resoou como a voz do arcanjo de Deus. - Parai! gritou ela, esta voz caindo em cascata sobre as nuvens, do alto do centro dos céus. O homem parou, o nome de Cristo suspenso nos seus lábios. Os outros vol- taram a cabeça. Era Lea, a mulher do apóstata. Ela brilhava e dominava, esta mulher frágil e mortal. - "Parai! gritava ela. vós esqueceste- -vos? Esqueceste-vos que dia é este? Quê! Não é o dia mais sagrado, o dia do Grande Perdão? - Tocarieis no que serve para fazer fogo ou para cozer alimentos? Tocarieis num animal dos campos que seía impuro? E vós porieis a mão sobre esta coisa da maior impiedade? Como não seriam manchados os vossos dedos neste mais santo dos dias? Voltai para os vossos lugares, eu vo-lo digo. Deixai-o falar até que a sua lingua obscena lhe caía da boca. Tapa¡ os vossos ouvidos com as mãos, homens, mulheres e crianças desta Sinagoga. Sou eu que vos peço por Deus. Deus nomeará o vingador, não tenhais receiol Eles retomaram os seus lugares, homens. mulheres e crianças. Ela retomou o seu lugar contra a grade. Ele retomou ainda uma vez o seu tema interrompido, o Cristo e o amor de Cristo, o Cristo e o seu terror. Homens, mulheres e crianças permane- ciam acocorados, a cabeça sobre os joelhos, as mãos apertadas contra as orelhas. Eles não ouviam nada. -Gesto secular de Israel! Exclamou ele. Teimosia feita carne! Eles não mexeram. Os seus rostos es- tavam cinzentos como túmulos. As pala- vras param-lhe nos lábios. o seu pescoço cedeu. O seu corpo esterilizou-se. Ele saiu como uma besta vergonhosa, e batida. Eles tinham-no vencido, eles tinham vencido o Cristo. Nota da Redacção- O que acabam de ler foi extraído do romance, publica o em Londres, Day of Atonement. O seu autor é o romancista judeu Luíz Golding. O assunto do romance é o conflito de duas almas, Elias, que se converteu ao cristianismo e se fez missionário. e sua mulher Lea, que ficou fiel ao judaísmo. dílacerada entre a sua fé e o seu amor. ---------------------------------------------------- HANUKAH (o simolo da luz) Não há simbolo mais universal que o da luz. E não há nada de mais religioso. Se a religião não é o facho que dirige os nossos passos durante toda a nossa carreira terrestre, a doce flama que nos acalenta quando as provas e as desilusões da vida lançam sobre a pobre alma um frio mortal, a penetrante claridade que nas horas per- turbadas da hesitação e da dúvida, nos mostra o dever a cumprir, o bem a fazer, a tarefa a desempenhar, então ela não é senão de secas abstracções, vãs fórmulas, gestos rotineiros. Todas as religiões tomaram pois o fogo para rito simbólico; as mais simples, con- siderando as dificuldades que o homem experimentava a obtê-lo, o honraram como a grande manifestação da potência divina, as mais perfeitas guardaram-no como eng- blema espiritualizando-o. As que o rejei- taram transformaram os seus templos em salas de reuniões onde não se sente a sua presença e onde resuma o aborrecimento: elas substituiram a tradição pelo racio- nismo e o seu culto tornou-se um perpé- tuo discurso, uma troca de opiniões indivi-
N.º 135, Tishri-Kislev 5707 (Set-Nov 1946)
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