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N.º 156, Tishri 5719 (Set 1958)







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António José da Silva (0 Judeu)

António José da Silva, filho do advo-
gado ]oão Mendes da Silvae de Lon-
rença Coutinho, nasceu em 1705, no
Brasil, então colónia portuguesa.

Formou-se em direito, em 1726, na
Univerdidade de Coimbra. Desde muito
novo. porém, revelou grande vocação
literária e a sua primeira peça teatral
"História do Grande D. Quixote de la
Mancha e do gordo Sancho Pança" foi
representada no teatro do Bairro Alto,
em 1733, com extraordinário êxito.

Seguiram~se "Esopaida" e "Encantos
de Medeia" que em 1735 obtiveram,
igualmente, grande sucesso.

Em 1736 representaram-se mais duas
peças suas; "Anfitrião" e "Labirinto de
Creta", com idêntico triunfo.

No carnaval de 1737 apareceu uma
nova peça ou ópera joco-séria, intitu-
lada "Guerras do Alecrim e Mangerona"
que, como as anteriores, foi delirante-
mente aplaudida.

Escreveu ainda "Variedades de Pro-
teu" e "Precipício de Faetonte".

As suas peças eram tão engraçadas
que toda a gente corria ao Bairro Alto,
para não perder as "óperas do judeu",
como então lhes chamavam.

E tão Viva e imorredeira era essa
graça que duzentos e vinte anos depois,
torna a ressurgir das cinzas do passado
com o reaparecimento de "Guerras do
Alecrim e Mangerona", no Trindade,
pelo Teatro Experimental do Porto.

O público de Lisboa encheu o teatro.
riu-se e aplaudiu novamente a obra de
António José da Silva, "primo carnal
de Goldoni e de Molière, tão bom como
Sheridan ou como Marivaux", no dizer
de António Pedro, o artista que criou
o Teatro Experimental do Porto e que
tirou agora do esquecimento-esta engra-
çadissima peça, prestando assim justa
homenagem ao seu autor.

Só foi pena que um doloroso pensa-
mento não nos tivesse deixado gozar,
plenamente, a beleza e a alegria do
espectáculo.

Enquanto o público aplaudia com
entusiasmo e se ria com verdadeiro
prazer, enlutava-nos a alma a lembrança
triste de que .António ]osé da Silva foi
queimado na fogueira do Santo Oficio.
no dia 18 de Agosto de 1739, apenas
com trinta e quatro anos de idade!

Custa-nos a acreditar que, naqueles
tenebrosos tempos em que existiu a
Inquisição em Portugal, os homens fos-
sem capazes de cometer tão monstruoso
crime, A nossa consciência revolta-se,
o nosso coração confrange-se só de pen-
sar que aquele mesmo povo, que enchia
o teatro epara quem António José
escrevia, assistiu impassível à sua
horrorosa morte, sem um protesto, sem
um grito de indignação e de dor!

Todas as atrocidades, praticadas pelo
Santo Ofício, nos causam pavor, mas
mais ainda quando a pessoa atingida
era um talento como 0 malogrado autor
de "Guerras do Alecrim e Mangerona".

A sua morte não foi somente uma perda
irrernediável para a sua familia e para
os seus amigos: foi também um rude
golpe para o teatro português.

Com o desaparecimento de António
José da Silva, a Pátria ficou roubada
no seu património artístico. Portugal
não pode guardar todos os tesouros que
aquela inteligência brilhante lhe teria
oferecido, se os algozes lhe tivessem
dado tempo de acabar a sua obra.
Se, tendo sido morto tão jovem, nos
deixou ainda as peças a que acima nos
referimos, quanto não teria ele enrique~
cido O nosso teatro se tivesse vivido a
sua vida até ao fim?

E surge-nos oufra interrogação,
igualmente dolorosa: de que crime foi
acusado este homem cheio de talento?
A sua origem judaica.

De nada lhe valeu ser baptizado e
ñlho de baptizados. A Inquisição tam-
bém não poupava os cristãos-novos e
bastava esse facto para que o Santo
Ofício o vigiasse constantemente, pro-
curando descobrir, na sua obra e nas
suas sátiras, intenções que ele não teve
e interpretando as suas palavras como


 
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